
Pós-Graduado em Direito
“Jonas Moraes diz também que Luiz
Gonzaga trouxe a materialidade da pobreza rural sertaneja para a sua cultura
acústica...”
No ano do centenário de
Luiz Gonzaga, nascido em 13 de dezembro de 1912, nenhuma personalidade
brasileira foi antes tão homenageada em todo território nacional quanto o velho
cantador do Nordeste. Claro, com todo merecimento. Eu mesmo tive a oportunidade
de estar na cidade de Exu-PE, nas festividades alusivas ao dia do seu
centenário, em 13 de dezembro último, a convite de amigos, e pude constatar o
respeito, a admiração, a gratidão e a paixão do povo nordestino, especialmente
os pernambucanos e os artistas, pelo inolvidável trovador do sertão.
Na esteira das homenagens
durante todo o ano do centenário de Luiz Gonzaga, o Piauí fez bonito e teve
brilhante e efusiva participação. Já em todo o mês de março de 2012, foram
apresentados no espaço artístico e cultural Artes de Março, do Teresina
Shopping, shows dos melhores intérpretes gonzagueanos do Brasil, além da
exposição do seu acervo oriundo do Museu em Exu. Fez também estrepitoso sucesso
a Cantata Gonzagueana (Orquestra Sinfônica de Teresina interpretada por João
Cláudio Moreno) sob a batuta do versátil maestro Aurélio Melo, que se
apresentou magnificamente no Senado Federal e nas comemorações na cidade de
Exu.
Mas para coroar a
participação piauiense nas homenagens a Luiz Gonzaga, nada mais dadivoso que o
lançamento em São Paulo, Recife e, no dia 21 de dezembro, em Teresina, do livro
“Sons do Sertão: Luiz Gonzaga, música e
identidade”, de autoria de Jonas Rodrigues de Moraes, primo e conterrâneo
da cidade de Paes Landim-PI, mestre e doutorando em História Social na PUC/SP.
Jonas Moraes, além de historiador (UESPI), é também graduado em Educação
Artística (com habilitação em Música) pela UFPI, e a referida obra foi a sua
tese de mestrado que se transformou em tratado com vertentes pesquisadas na
estilização do baião, invenção da identidade (música e performance) e
hibridação musical (o nacional e o regional).
O autor mostra com raro
conhecimento o encontro de Luiz Gonzaga com o compositor Humberto Teixeira que
decidiram que a música ou ritmo para o Norte e os nordestinos no Sul, seria o
baião. A “recriação” do baião por Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, segundo
ainda o autor, veio por ser uma música dançante e uma estratégia de sonoridade
discursiva da relação da identificação dos nordestinos com a região. Pois as
imagens que essa música constrói servem para realimentar na memória dos
nordestinos e dos brasileiros uma situação de penúria, de desolação. O baião é,
pois, o repertório musical de Gonzaga para a institucionalização do Nordeste.
Jonas Moraes diz também
que Luiz Gonzaga trouxe a materialidade da pobreza rural sertaneja para a sua
cultura acústica, mostrando as dificuldades que a sua família e demais
moradores da região passavam para sobreviver no sertão nordestino. Mostra
igualmente a influência dos elementos sonoros da Serra do Araripe relacionados
ao canto das ladainhas, dos novenários, dos benditos, a um fazer musical e sua
interinfluência com a música sacra. Luiz Gonzaga foi o cantador/narrador cujas
composições trouxeram uma forma de cantos baseado em elementos de narrativa
oral nordestina. Diz ainda o livro que o artista, em seus aboios, revelou
significados que reverberaram um lugar social vivido pelos vaqueiros ao longo
do tempo.
A obra trata do nacionalismo
e do nacional-popular na perspectiva de se compreender como essas categorias se
forjaram na música brasileira a partir de Luiz Gonzaga. O sanfoneiro sempre
colaborou para a elevação da nação, bem como para a exaltação do trabalho.
Gonzaga também deu amplitude à sanfona e criou o seu trio musical. Incorporou o
zabumba como instrumento de acompanhamento dos cânticos religiosos nas igrejas
e o triângulo como instrumento das festas nas feiras do interior. Enfim, o
autor observa que os ritmos propostos no repertório de Luiz Gonzaga levaram os
nordestinos do sul para a sua região e para a instituição imagética sonora de
nordestinidade. Por isso, “Sons do Sertão: Luiz Gonzaga, música e identidade” é
um livro que todos os piauienses deveriam conhecer, por mostrar um sanfoneiro
muito mais profundo para a música popular brasileira do que muitos sabem,
pensam ou imaginam. É uma leitura superprazerosa, substanciosa,
imperdível!
* Artigo publicado no Jornal Meio Norte, Página A/2: Opinião, Segunda-Feira, Teresina-PI, 14 de janeiro de 2013
Site: http://www.jornalmn.com.br/